Melancolia...

Em uma caixa abandonada, lembranças esquecidas repousavam indiferentes ao mundo. Elas permaneciam incólumes apesar dos anos, das distâncias e das pessoas. A essência de cada uma era a mesma, independente da coloração envelhecida, do bolor e das marcas do tempo. Recortes de jornais e revistas com fotografias dos atores e cantores prediletos. Desenhos feitos há tanto tempo que os traços já eram quase irreconhecíveis. Textos escritos nos piores e nos melhores momentos. Alguns expressando toda a emoção da alegria e outros toda a dimensão da tristeza. Cartas nunca enviadas. Poemas sem um fim. Retratos do que fomos com a insígnia do instante e, no segundo seguinte, o veredito do passado. Piscamos e passou. Sorrimos, choramos e o riso e a lágrima já não sabem mais o que são. Não devia ser assim, tão fugaz e forte. É duro sentir a cada instante o instante que se aproxima prestes a começar. E não sei mais o que sentir. Entre o que passou, o que é e o que está para ser. Mas há de ser sempre assim, a constância do tempo contrastando com a inconstância do sentir.

A lição do dia...

Hoje aprendi uma das lições mais importantes de toda a minha vida. E levei 14 anos para aprender. Olhando pelo lado positivo, antes tarde do que nunca, não? Pois bem, vou repassar minha experiência. Você pode até esquecer o aniversário de um amigo ou o aniversário de casamento. Pode esquecer de pegar a toalha ao entrar no banho. Pode esquecer de apagar as luzes quando sai. Pode esquecer de um compromisso. Pode esquecer o fogão ligado e quase incendiar a casa. Pode quebrar dois copos no mesmo dia. Pode até mesmo deixar o café esfriar. Pode esquecer de quase tudo. Mas NUNCA se esqueça: se abrir, F-E-C-H-E!

A ti, noite, um pouco de Drummond.

Passagem da noite

É noite. Sinto que é noite
não porque a sombra descesse
(bem me importa a face negra)
mas porque dentro de mim,
no fundo de mim, o grito
se calou, fez-se desânimo.
Sinto que nós somos noite,
que palpitamos no escuro
e em noite nos dissolvemos.
Sinto que é noite no vento,
noite nas águas, na pedra.
E que adianta uma lâmpada?
E que adianta uma voz?
É noite no meu amigo.
É noite no submarino.
É noite na roça grande.
É noite, não é morte, é noite
de sono espesso e sem praia.
Não é dor nem paz, é noite,
é perfeitamente noite.

Mas salve, olhar de alegria!
E salve, dia que surge!
Os corpos saltam de sono,
o mundo se recompõe.
Existir: seja como for.
A fraterna entrega do pão.
Amar: mesmo nas canções;
De novo andar: as distâncias,
as cores, posse das ruas.
Tudo o que à noite perdemos
se nos confia outra vez.
Obrigado, coisas fiéis!
Saber que ainda há florestas,
sinos, palavras; que a terra
prossegue seu giro, e o tempo
não murchou; não nos diluímos.
Chupar o gosto do dia!
Clara manhã, obrigado,
o essencial é viver!
Carlos Drummond de Andrade


Sempre quis escrever um poema sobre a noite. É noite. Noite de domingo. Noite que não deseja findar, como todas as noites de domingo. Porém a pior das noites se alegra com os versos de Drummond. Sendo assim, que venha mais uma manhã clara de segunda, pois o essencial... Bom, o essencial é viver.

Sobre o verbo "piorar"...

Manhã agradável à sombra das árvores com um amigo e um violão, canções e trechos de livros. Almoço com o sorriso que me leva a sorrir tomando Guaraná. E, é claro, fazendo todos os trocadilhos imagináveis e inimagináveis. A tarde passa vagarosa. Através das cortinas mal fechadas, escapam raios radiantes de sol. A luz convidativa inspira sonhos desesperados de fuga. Quem nunca quis fugir de uma aula sonolenta de Geografia? Enquanto eu penso no sol, o professor fala, fala, fala. Bocejo. Escuto. Bocejo. Paro de escutar. Encosto o queixo entre as mãos: o retrato típico do aluno entediado. Mas não... Eu quero prestar atenção sem que o rumo dos meus pensamentos oscilem. CAFÉ. Claro! Depois de tomar alguns goles de café, as palavras começam a fazer sentido. O final da aula chega rápido. Abraço a liberdade do intervalo de vinte minutos que mais parecem dois segundos. Indo para casa, penso: "sabe, o dia foi bom". Pensamento precipitado. O dia ainda não havia terminado. O pior estava por vir. E no dia seguinte pela tarde o pior do pior e pela noite o pior do pior do pior. Não me atrevo a perguntar o que de pior pode sobrevir. Os acontecimentos ruins não podem ser proporcionais aos bons, portanto, pare onde está, azar! Ou, talvez, Lara, seja menos desastrada, não seja tão você em tempo integral.

De repente e não mais...


   Lua cheia e estrelas. Pois em noites especias, esses dois elementos não se ausentam. Jovens sobre a grama verde salpicada pelo orvalho da noite. De repente, não mais que de repente, quase todos decidem fazer alguma coisa longe. Um casal permanece. Eles não percebem que os outros saíram. Quando conversam é como se os outros não existissem e no mundo só houvesse os dois. Ele pega a mão dela e diz que não imaginava que conversar com ela era tão bom e que estava feliz por estar onde estava naquela noite. Logo depois, percebem que estão sozinhos. E riem um pouco por nem ter visto todos saírem. Ele olha a lua. Ela olha para ele e ergue o olhar, uma estrela cadente corta o céu e um pedido ecoa recíproco em ambos os corações. Como se não estivesse óbvio o que estava acontecendo ela diz:
- Faz um pedido.
- Eu só gostaria que essa noite nunca mais acabasse, que esse momento fosse eterno.
- Digo que todo momento pode ser eterno se o guardarmos em nossos corações. - Diz ela olhando em seus  olhos.
   Hesitante, ele deposita as mãos sobre as dela e diz que seu coração já é de outrem.. Um celular toca, "I'm not saying it was your fault , although you could have done more. Oh you're so naive yet so" . Ela  faz menção de atender. Ele interrompe o gesto pela metade e diz baixinho:
- Vamos dançar?
   Em um movimento rápido ele está em pé com a mão estendida em convite. O celular para de tocar simplesmente emudecido pela beleza da cena. Eles dançam abraçados quase como um só. Aconchegados nos braços um do outro. Não havia necessidade de música, eles eram a melodia. A grama sob seus pés. As estrelas os vigiando. Lentamente a noite é selada com um beijo. Ele a abraça forte e eles permanecem ali, com os olhos fixos um no outro, realizando o desejo que feito à estrela cadente.

Bianca Cordazzo e Lara Quiche, em nome dos velhos tempos, de todas os nossos contos e poemas. 

Algumas palavras...

Graciliano Ramos soube explicar como ninguém um dos motivos pelos quais eu escrevo. Ele dizia, " uma experiência literária realizada, uma experiência humana superada." Nem sempre é assim. Mas, pelo sim, pelo não, eu continuo escrevendo, uma vírgula e até.

Uma noite de céu estrelado...

Os dias passam com a efemeridade de um suspiro de alívio. Dentre eles, um dia especial, cujo desfecho foi banhado pelo luar, pelo café e pelas nossas vozes desafinadas a cantar. A noite nunca é longa o suficiente quando se tem as companhias certas. A lua persiste no céu enquanto nossos pensamentos nela estiverem. E o sol cisma em não aparecer para nos manter mais tempo juntos. Os olhos fixos nas estrelas percebem um movimento inusual. Mirando a quebra da mobilidade estrelar, respiro a brisa da noite. Gravo a imagem e fecho os olhos. Sei que além, muito além, talvez haja esperança. Um pedido não consegue não ser feito. Um desejo egoísta, mas puro e inevitável. Quatro xícaras de café esquecidas no chão ao nosso redor. Duas ausências. Outra presença que se faz ausência: evade-se para o sono sob o concreto frio. E uma consciência confusa coexistindo no mesmo corpo onde um coração partido lamenta. A música certa para a pessoa errada. Os acordes soando, soando... Trazendo a cada som, a cada verso, um par de lágrimas sem... razão? Não. Sem razão não. Há, sim há. O que não há é a coragem para admitir que as lágrimas nunca são sem sentimento. Que por trás delas sempre há uma razão.

Uma prece...


Há tanto o que dizer, sempre há. Às vezes não há a quem. Às vezes não há voz. Mas quando os lábios calam, os dedos trabalham. Sagazes no teclar ou no ato de segurar o lápis. Então as palavras transverberam o sentimentos contidos, os pensamentos ocultos e tudo o que houver de excesso dentro de nós. Seja amor, seja ódio, seja angústia, seja alegria. Seja o que for. Basta haver algo para expressar. Só não pode não haver. Antes a hipérbole do sentir ao vazio do nada. Um salve ao exagero! Outro mais louvável ao desalinho! Uma prece improvisada à imaginação e à inspiração: Que das dificuldades surjam soluções entrevistas em mirabolantes inventos ou poemas de exuberantes. Que cresça e nunca pereça a curiosidade das mentes e as indagações frequentes. Que os olhos não se fatiguem de buscar no velho o novo e no novo o imutável. Que o bem alcance os corações. Que a sensibilidade triunfe. Que a prece jamais cesse de ecoar e o homem nunca deixe de amar. Amém!