Fica pra outro dia...

   Aí você pensa que vai começar bem. Porém não é assim que funciona. Logo nas primeiras horas decisivas do mês, sua cabeça é trespassada por um turbilhão de pensamentos que pulsam e doem contundentemente. E a noite termina assim: você desabando com roupa impregnada de rua e gente, sapato e maquiagem borrada na cama. Depois do terceiro comprimido de um genérico qualquer pra amenizar a dor, a vida fica em câmera lenta. A espera um telefonema que não é feito. A campainha calada. Qualquer coisa que afaste os pensamentos indesejados serve. Os vinis jogados pelo chão lembram do toca disco quebrado no fundo do guarda-roupa. Aquele que você nunca levou no conserto. Amanhã levo. Não, amanhã é sábado. Segunda quem sabe. E você sabe que segunda vai chegar cheia de compromissos (in)adiáveis, e que não, você não vai sair da rotina. Por que não? Ligo o som para preencher o vazio do quarto. Deixo tocar o CD que estava ali. Infinita Highway começa dilacerando o silêncio sepulcral da noite. Inundando-me de vida. Vontade cigana de viajar por aí. Sem ter destino. Só para pensar e ver o que há de novo nesse mundo velho. O novo da vida. O novo dentro de mim. Tiro os sapatos que caem no chão aliviando meus pés. Busco na cabeceira da cama meu livro e viajo para a França com Sartre.  Enquanto Antoine Roquentin está descobrindo a falta de sentindo da sua vida, eu tento entender a minha. É a náusea. Introspectiva, fecho o livro e cá estou de volta. Encolho os joelhos junto à barriga e me viro para a parede repleta de rostos famosos. Dou boa noite ao Chicho Buarque. Good Night,  Marlon Brando. Bonne nuit, Alain Delon. Buenas noches, Che Guevara. Apago a luz, desligo o som. A falta de sentido prevalece, porém já passa das duas e é tarde demais para pensar em temas tão abstratos. Segunda-feira eu penso nisso.


Por um mundo com mais Led Zeppelin...

   Meio ano. Meio sem sentido. Meio sem razão. Sabe. Meio assim... Meio que totalmente. D i g i t a r espaçadamente por não saber ao certo como dizer o que se quer dito. Talvez medo. Ou não. Tanto descompasso que cá estou, assim, perdida e despida de qualquer raciocínio lógico. A canção era a mesma daquela outra noite. O solo perturbador de Page inundando os sentidos. A cadência pulsando em meu peito. As palavras confortantes me davam esperança para seguir mesmo sem saber..." Just believe and you can't go wrong. In the light you will find the road. You will find the road." Saber o quê? O que nós precisaríamos saber naquele momento, meu bem? Sem contingências sobre nós, sobre o futuro. Estava tudo explícito na luz plácida da noite. Noite sem lua. Apenas os seus braços ao meu redor. O chiado do toca disco antigo a rodar infatigável. O piar grave das corujas velando a escuridão por nós. E você ali... comigo. A canção continuava. "Though the winds of change may blow around you, but that will always be so." Que a canção não cesse. Que esse momento não acabe. Que continue e continue e continue o mesmo sempre que os primeiros acordes da música soarem. E então tudo voltará. Voltará a ser o mesmo.